sexta-feira, 29 de março

Teologia sistemática | as tarefas da teologia sistemática | parte 2/6

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Extraído do livro: Eu Sou – Volume 1, de Heber Campos, da Editora Fiel.

Teologia Sistemática

E a tarefa de se relacionar com outras disciplinas da teologia | Parte 2/6

A Teologia Sistemática não pode ficar apartada de outras disciplinas da Teologia cristã, pois com elas se relaciona de forma harmônica. Van Til apresenta, de forma sucinta, a relação entre a Sistemática e outras disciplinas da Teologia, com base na opinião de vários autores reformados:

A exegese toma as Escrituras e analisa cada parte em de talhes; a Teologia Bíblica toma os frutos da exegese e os organiza em várias unidades, traçando a revelação de Deus na Escritura em seu desenvolvimento histórico. Ela retira a Teologia de cada parte da Palavra de Deus como tem sido trazida para nós em diferentes estágios, por meio de vários autores. A Teologia Sistemática, então, usa os frutos dos labores das Teologias bíblica e exegética, trazendo-os juntos, num sistema concatenado. A Apologética procura defender esse sistema de verdade bíblica contra a filosofia falsa e a falsa ciência, enquanto a História da Igreja traça a recepção desse sistema de verdade no curso dos séculos.

a) Relação entre Teologia Sistemática e Teologia Bíblica

Vários teólogos e apologetas opinam sobre a relação entre Teologia Sistemática e Teologia Bíblica. O apologeta Van Til diz que a tarefa da Teologia Bíblica é coordenar os resultados esparsos da exegese num todo concatenado, seja com referência a um livro isolado da Escritura, seja a um corpo de livros relacionados ou ao todo da Escritura.

Não é equivocado dizer que a Teologia Bíblica é feita de maneira linear, seguindo o raciocínio de cada autor, obedecendo, primeiramente, ao pensamento de cada um deles e, no final, estabelecendo a respectiva comparação.

A Teologia Sistemática, quando devidamente elaborada, não deve ter uma resposta diferente da Teologia Bíblica quando esta é também devidamente formulada, porque, embora ambas as metodologias apresentem abordagens distintas, não são inimigas.

Richard Lintz diz que a Teologia Bíblica não é, portanto, uma rival da Sistemática, nem mesmo um produto paralelo do mesmo corpo de fatos proporcionados pela exegese; ela é a base e a fonte da Sistemática. A Teologia Sistemática não é uma concatenação de dados teológicos esparsos fornecidos pelo processo exegético, mas a combinação dos dados já concatenados dados a ela pela Teologia Bíblica.

Conheci vários professores de Teologia Bíblica que têm muita reserva contra a Teologia Sistemática, como se a Sistemática fosse menos bíblica do que a chamada “Teologia Bíblica”. É bem verdade que houve alguns sistemáticos que, na elaboração de sua Teologia Sistemática, falaram mais da opinião dos homens e da filosofia do que propriamente da Escritura. No final das contas, a Sistemática era uma mera opinião de homens.

Assim, para justificar seu pensamento, colocavam os textos em nota de rodapé ou em outro lugar qualquer, sem fazer as devidas ligações do pensamento com o texto. Eles não retiravam sua Teologia do texto da Escritura. Por essa razão, muitos se tornaram adversários da Teologia Sistemática. Eu também acho impróprio fazer Teologia Sistemática dessa maneira. Por essa razão, na elaboração da Sistemática, os teólogos devem partir eminentemente da Escritura, usando os bons resultados da exegese e da Teologia Bíblica, a fim de produzir um bom material, que culmine em bom ensino e boa pregação para a igreja de Cristo.

A Teologia Bíblica trata com os dados da revelação especial do ponto de vista de sua história; a Teologia Sistemática trata com os mesmos dados, em sua totalidade, como um produto terminado. O método da Teologia Sistemática é lógico, enquanto o da Teologia Bíblica é histórico.

Enquanto a chamada “Teologia Bíblica” lida com a revelação verbal de forma linear, no decorrer da história da revelação, a chamada “Teologia Sistemática”, tomando os resultados da exegese e da Teologia Bíblica, trabalha de forma espiral, analisando a totalidade da revelação verbal e olhando cada parte da Escritura à luz da totalidade da Escritura.

A Teologia Bíblica, propriamente concebida e desdobrada, deve seguir as linhas delineadas para nós nas Escrituras. Ao grau em que estas linhas são abandonadas ou reconstruídas, essa Teologia cessa de ser Teologia Bíblica.

A Teologia Sistemática “é aquele departamento ou seção da ciência teológica que está preocupado com a demonstração sistemática do todo concatenado, daquilo que é conhecido a res peito de Deus”. O teólogo sistemático está preocupado com a coleção de dados de acordo com uma estrutura de tópicos no ensino do cânon completo. A Teologia Sistemática não é uma estrutura artificial para se entender a Deus, mas, antes, a expressão das relações reais sustentadas entre as verdades reveladas a respeito de Deus. De maneira bem didática, Warfield sugeriu que a Teologia Bíblica

proporciona o solo no qual cresce a Teologia Sistemática. A exegese não é a mãe da Teologia Sistemática, mas sua avó. A Teologia Bíblica seria a verdadeira mãe. Os dados para a Teologia Sistemática não são os textos individuais ou os resultados individuais das exegeses de textos individuais, mas antes a concepção completa da verdade revelada e oferecida pela Teologia Bíblica.

Lints ainda observa que a ironia aqui é que a disciplina que estava para providenciar a base para a Teologia Sistemática ainda não existia para a maior parte da vida histórica da Teologia Sistemática. A filha era aparentemente muito mais velha do que o pai. A Teologia Sistemática (na visão de Warfield) era tão velha quanto a igre ja cristã. No entanto, a Teologia Bíblica, sendo relativamente nova, estava de alguma forma destinada a fornecer os dados dos quais iria surgir a Teologia Sistemática. Como era possível haver tal coisa como Teologia Sistemática sem uma anterior Teologia Bíblica?

É curioso observar que a cadeira de Teologia Bíblica só entrou nos currículos no século XIX. Lints acrescenta que é notável que a cadeira de Teologia Bíblica que Vos aceitou quando concordou em vir para o Seminário de Princeton, em 1893, era uma cadeira recém-criada. E é seguro dizer que Princeton estava relativamente à frente de seu tempo a respeito da criação desta cadeira, pelo menos entre os seminários teológicos conservadores.

Gerhardus Vos “mostrou que sua preocupação central era argumentar para a complementaridade das Teologias Bíblica e Sistemática, mostrando-se contrário à ideia dominante de que ambas eram duas disciplinas em conflito”. A Teologia Bíblica e a Sistemática são interdependentes. A Sistemática precisa dos resultados da Teologia Bíblica, assim como a Bíblica depende dos pressupostos da Sistemática. A Teologia Bíblica é amiga da Sistemática quando a primeira estuda “o processo da autorrevelação de Deus depositada na Bíblia”.

Uma não é menos ou mais bíblica que a outra. A diferença entre ambas está apenas na organização do material e na metodologia de estudo. A Teologia Bíblica organiza o material em uma estrutura histórica, enquanto a Sistemática o organiza temática ou topicamente. A Teologia Bíblica desenha uma linha de desenvolvimento linear, enquanto a Teologia Sistemática desenha a Teologia de forma espiral ou circular. Ou seja, a Teologia Sistemática tenta apresentar uma Teologia olhando a revelação divina como um todo em todas as épocas, uma forma circular de ver a doutrina. Na Teologia Sistemática, por sua vez, a obra criadora original, a obra redentora de Deus que culmina na criação dos novos céus e da nova terra, é apresentada como um projeto completo. Lints diz que a Teologia Bíblica como uma disciplina deve ser regulada em seu conteúdo e em sua estrutura pelo texto bíblico (…) o texto pode dar o ímpeto original para a Teologia Sistemática, mas a estrutura lógica pela qual a Sistemática organiza o material bíblico não é idêntica à estrutura do texto.


Autor: Heber Carlos de Campos

É graduado pelo Seminário Presbiteriano de Campinas (1973); fez seu mestrado em Teologia Contemporânea (Th.M.) no Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição (1987) e doutorou-se em Teologia Sistemática no Concordia Theological Seminary, Saint Louis, Missouri, EUA (1992). Foi diretor do Seminário Presbiteriano Brasil Central (Goiânia, 1985-1989) e professor do Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição, foi diretor do CPAJ entre 1993 a 1999 (2004, interinamente) e tem exercido o ministério pastoral na Igreja Presbiteriana do Brasil por mais de 35 anos. É membro da Academia Paulista Evangélica de Letras (APEL). Além de artigos em periódicos brasileiros, suas obras significativas são: "O Ser de Deus e Seus Atributos" (1999), "Fé Cristã e Misticismo" (2000 – co-autor), "A Providência de Deus e Sua Realização Histórica" (2001), "As Duas Naturezas do Redentor" (2004), "A união das naturezas do Redentor" (2005), "A humilhação do Redentor - Encarnação e Sofrimento" (2008). Dr. Heber está presentemente concluindo sua próxima obra, "A Humilhação do Redentor - Sua morte e sepultamento".

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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